sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Ficamos assustados com o tempo...
O tempo passado numa veloz velocidade
Presente imitando passado no mais óbvio:
Na crueza e indócil trapaça.
Hoje a dor permanece acesa como um medo
De diferença nenhuma haver.

A pressa não pode ser amiga aliada...
Sigo seguinte passo...

sábado, 16 de outubro de 2010

amiga minha disse do éter, do vento, do urubu. disse da década do agora. do ciclo. da roupagem do tempo. do apocalipse.
amiga minha tem coração em brasa. Conhece vida, conhece gente, conhece alma.
Queria poder com ela fazer o dito: banho de cachoeira, brincadeira na lama.

falamos sobre o abismo, a Dança.
"Abismo é onde o urubu caga. Porque eu nunca vi urubu cagando"
Ainda devo reflexão a vida e a amiga. Ainda volto aqui pensar disso tudo.

O peso da alma é o duro do corpo.

assim seja, o d'agora.
O abismo é passível de se enfrentar pela Dança.
A ventania apenas começava. Forte, intensa.
O tempo-outro abismava passagem.
Todos tentavam segurar seus pertences.
Vento forte. Bravo.
Depois aconteceu que no céu se via redemoinhos.
Compridos, longos. De susto e beleza.
Foi que fugi. Corríamos em direções todas a procurar abrigo.
Dali se chegou a proximidade com o furacão. Imenso, se aproxima.
De lado a outro tentava-se correr, mas não foi. Eu. Escolhida fui.
Escolhida de mim, por mim, para mim.
O redemoinho me perseguia. Sem poder recuar, paro e uma nuvem se faz, sobre minha cabeça. Cai chuva.
Quando espera-se que tudo acabe, lá vem um abutre.
Fora de céu. No chão. A encontrar um jeito-maneira de cagar.
Do susto o aumento tanto. Um abutre cagando.
Fixada imagem. Fim de ventania. Espaços, silêncio.
Olhar o céu e vê-se que de mais longe vem uma maior tempestade.
Agora negra, menos bonita e mais insegura.
Em tempo de preparo e conhecimento de causa. Rompemos lance de esconder-se.
Proteger-se. Sim. Maior coragem.
Quando se olha para traz, a novidade, novinha. O tempo desfez.
Calmaria houve.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

31... 31...
Abençoada ainda: durante o dia pude lambuzar-me com uma manga bourbon e sentir o cheiro de mato.
Na semi-liberdade.
Lá cortam gramas e bate-se o cartão do almoço.
Trinta e um... Trinta e um... a infância permanece viva.

domingo, 3 de outubro de 2010

A casa

No tempo, a casa do possível... Papai ralhava na construção da casa do sonho.
Primeiro, a minha, menina.
Brincava entre as cadeirinhas acolchoadas inventando a casa nossa.
No depois, vi que ele construia bloco por bloco a casa nossa.
Aquele tempo, o mais velho de nós ficou para trás.
Da nossa casa, um quintal imenso se abria. Árvores de variados entortamentos, o cajueiro em flores. Bicho de tipos, outros.
Detrás montanha imaginavámos mais alto sonho de ver mar. Mar aberto, mar sem desenho, só ventania.

Três Marias

As três moças nascidas na beira do rio, recebia em sua travessia os tropeiros que vinha de longe atravessar margens.
No tempo e no quando foi que as moças brincavam a beira d' água. Foi que não sabiam que naquele dia a água vinha desregulada.
Uma a uma, foi entregar à água a travessia pro lugar do não sei onde.
A primeira moça, na perdida busca do meio foi quem se afogou primeiro. A água construída a tempo de levá-la pro centro do desconhecido espaço, do encantamento...
Foi que a outra, esbarrado espanto buscou encontrar na vida da água viva o mar do inalcançado alcance. Tentou ao meio, encontrar a moça do meio. Tentou negócio ação. A água veio e levou.
Foi que a terceira à luz do atravessamento, buscou achar horizonte outro. Travessar travessia. Desencontro, desencanto. Desengonço. O tempo fluiu. Navegante, navegável.
Sigo adiante. O tempo trespassado... Espaços de angústia, fome, ressentimento e dor. O humano, des-humano.
O que tenta comunicar, simplesmente não comunica.
O ato, desata, engasga. Lança fogo. Dragões maiores e menores.
Descuido, descaso.
Enquanto isso, o sangue escorre pelo tempo. A sombra do passado envolta a do presente.
Seguimos, seguintes, cegos.

domingo, 8 de agosto de 2010

hoje, os textos vieram a cabeça. mais uma vez exitei em dizê-los. mais uma vez fui expectadora de novelas interiores desprovidas de qualquer escuta interna. árvore espinhosa... esquivo... tresbusco...

quarta-feira, 14 de julho de 2010

maeternidade

a pouco, enquanto ninava um dos sonhos daqui, fui surpreendida com um olhar profundo e sincero que me fez lembrar a primeira vez em que "vi" minha mãe. Digo, primeira vez dentre todas as outras, não fui criada longe dela, fui crida por ela, mas...
não sei que idade tinha, talvez 13, 14 anos, talvez mais. o tempo do cronos não me reteve, mas a sensação interna nunca mais pude esquecer.
cada vez que me vem a imagem é como se tivesse acontecido a um minuto atrás. no eterno do tempo...
naquele momento meus olhos se debruçaram sobre seu rosto e foi como se tivesse saido de um encantamento. vi minha mãe. vi seus olhos. a textura e cor de sua pele.
dali nunca mais pude vê-la da mesma maneira, pois que ao fato sucedeu-se inúmeros insights e reflexões sobre a sua existência.
acho mesmo que foi naquele dia que nosso cordão foi cortado. não no eterno corte. mas naquele corte que nos fragmenta e inícia um processo que parece nunca mais acabar. aquele o qual até hoje me faz juizo.

terça-feira, 6 de julho de 2010

GRADUAÇÃO

Há uma semana finalizei um trabalho de dez anos. A sensação que temos quendo iniciamos algo e não concluimos é que para todo sempre estaremos acorrentados.
Quando olho "ao quê", vem sempre a pergunta de até quando iremos disfarçar? até quando teremos que utilizar a máscara para ser algo, poder dizer algo?
Sinto-me muito bem por ter fechado essas dez anos, apenas não acredito que para além do papel haja-me serventia. O papel me autoriza adentrar mais ainda num mundo de mentiras e bobagens. Todos nós correndo, desesperados prontos para irmos não se sabe para onde. Correndo a buscar a recompensa do "quê"?
Sinto-me agora amargada, amarga, jiló... o tempo me fez ver/sentir assim...
Isso jamais significa que deixei de acreditar na vida. Aliás, agora mesmo é que acredito. Mas o gosto da bilis me salta a boca quando entro em contato com o PAPEL. Aquele que me deu um grau. GRAU. DEGRAU. para cima ou para baixo? Sou mais um número, então. Nem importando para que direção.
e ouso repetir: não quero a faca nem o queijo, quero a fome!

AOS DADOS

lamento tanto. lamento quando entro em uma escola… lamento quando esses dados projetam. o que projetam… para mim, minha alma: longe estamos. longe de qualquer coisa cuidada e humana. longe de qualquer ideal. escolha.
se não preocupamos com os números, preocupamo-nos com o Nada. o Nada que nos acerta. aquele que deparamos todos os dias quando nos desagregamos no trânsito por nossa intolerância. quando dirijo-me a uma Unidade Básica de Saúde e sinto-me desagregada por tamanha (des) informação. informação mesma da forma. dessa forma que é a educação. dessa forma que é a que deforma, que numera, que quantifica, que desqualifica, que disfarça, que sempre e sempre reage.
Abaixo aos números! E como diria a poeta: Não quero a faca nem o queijo: quero a fome!

sexta-feira, 23 de abril de 2010

SEMENTE E FRUTO

Um dia, houve.
Eu era jovem, cheia de sonhos.
Rica de imensa pobreza
que me limitava
entre oito mulheres que me governavam.
E eu parti em busca do meu destino.
Ninguém me estendeu a mão.
Ninguém me ajudou e todos me jogaram pedras.

Despojada. Apedrejada.
Sozinha e perdida nos caminhos incertos da vida.
E fui caminhando, caminhando...
E me nasceram filhos.
E foram eles, frágeis e pequeninos,
carecendo de cuidados,
crescendo devagarinho.
E foram eles a rocha onde me amparei,
anteparo à tormenta que viera sobre mim.

Foram eles, na sua fragilidade infante,
poste e alicerce, paredes e cobertura,
segurança de um lar
que o vento da insânia
ameaçava desabar.
Filhos, pequeninos e frágeis...
eu os carregava, eu os alimentava?
Não. Foram eles que me carregaram,
que me alimentaram.

Foram correntes, amarras, embasamentos.
Foram fortes demais.
Construíram a minha resistência.
Filhos, fostes pão e água no meu deserto.
Sombra na minha solidão.
Refúgio do meu nada.
Removi pedras, quebrei as arestas da vida e
[plantei roseiras.
Fostes, para mim, semente e fruto.
Na vossa inconsciência infantil.
Fostes unidade e agregação.

Crescestes numa escola de luta e trabalho,
depois, cada qual se foi ao seu melhor destino.
E a velha mãe sozinha
devia ainda um exemplo
de trabalho e de coragem.
Minha última dívida de gratidão
aos filhos.
Fiz a caminhada de retorno às raízes ancestrais.
Voltei às origens da minha vida,
escrevi o "Cântico da Volta".

Assim devia ser.
Fiz um nome bonito de doceira, glória maior.
E nas pedras rudes do meu berço
gravei poemas.

Cora Coralina

quinta-feira, 22 de abril de 2010

ensimesmando...

Sim, por hora tenta-se encontrar a linguagem que alcance o outro, sem que deste se faça afastamento.
Difícil a comunicação com a palavra, prefiro mesmo a pureza do que me sobe as costas, que me alcança o ouvido - aquele da nuca, não o outro.
Dizer o amor é incompreender-se por vezes.
Nunca se sabe como chegará ao ouvido do outro a palavra que trazemos.
Queria a pureza da palavra, a verdade, a matéria pulsante dela, apenas.
Amigo, teu coração está aberto aqui...
Pulula nossos pensamentos e desencontros. Quero o ombro, a tranquilidade do ombro que nos cala e nos faz dizer tudo ao mesmo tempo.
Que tempo difícil, esse nosso. Sabemos de tudo e não sabemos nada...
Por isso, tentarei agora ficar com a oração que fiz para nós. Que nos tranquilize e nos dê melhores compreensões.
Que nos guarde, apenas, a boa impressão que sempre vem de nossos silêncios absolutos.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Para o Zé

Eu te amo, homem, hoje como
toda vida quis e não sabia,
eu que já amava de extremoso amor
o peixe, a mala velha, o papel de seda e os riscos
de bordado, onde tem
o desenho cômico de um peixe — os
lábios carnudos como os de uma negra.
Divago, quando o que quero é só dizer
te amo. Teço as curvas, as mistas
e as quebradas, industriosa como abelha,
alegrinha como florinha amarela, desejando
as finuras, violoncelo, violino, menestrel
e fazendo o que sei, o ouvido no teu peito
pra escutar o que bate. Eu te amo, homem, amo
o teu coração, o que é, a carne de que é feito,
amo sua matéria, fauna e flora,
seu poder de perecer, as aparas de tuas unhas
perdidas nas casas que habitamos, os fios
de tua barba. Esmero. Pego tua mão, me afasto, viajo
pra ter saudade, me calo, falo em latim pra requintar meu gosto:
“Dize-me, ó amado da minha alma, onde apascentas
o teu gado, onde repousas ao meio-dia, para que eu não
ande vagueando atrás dos rebanhos de teus companheiros”.
Aprendo. Te aprendo, homem. O que a memória ama
fica eterno. Te amo com a memória, imperecível.
Te alinho junto das coisas que falam
uma coisa só: Deus é amor. Você me espicaça como
o desenho do peixe da guarnição de cozinha, você me guarnece,
tira de mim o ar desnudo, me faz bonita
de olhar-me, me dá uma tarefa, me emprega,
me dá um filho, comida, enche minhas mãos.
Eu te amo, homem, exatamente como amo o que
acontece quando escuto oboé. Meu coração vai desdobrando
os panos, se alargando aquecido, dando
a volta ao mundo, estalando os dedos pra pessoa e bicho.
Amo até a barata, quando descubro que assim te amo,
o que não queria dizer amo também, o piolho. Assim,
te amo do modo mais natural, vero-romântico,
homem meu, particular homem universal.
Tudo que não é mulher está em ti, maravilha.
Como grande senhora vou te amar, os alvos linhos,
a luz na cabeceira, o abajur de prata;
como criada ama, vou te amar, o delicioso amor:
com água tépida, toalha seca e sabonete cheiroso,
me abaixo e lavo teus pés, o dorso e a planta deles
eu beijo.

Adélia Prado

SER TAO MAE

Sim. Escolhi meu caminho.
Tudo tem sido escolhas
Quanto ao impulso
gerado de minhas características
de meus estados
de meu passado
de meu instante
insight
formação
Hoje meu caminho é o que escolho.
Onde vou: não sei.
Mas sei onde não irei mais.